11/04/2020

Redação Games4U

Dandara é sim um dos games brasileiros mais divertidos do ano

iOS, Xbox One, PS4, PC, Nintendo Switch, Android 

Jogar Dandara: Trials of Fear Edition me trouxe um grande sentimento de orgulho. Em uma indústria tão gigantesca e que conta com poucos representantes brasileiros, é contagiante ver nossas desenvolvedoras tupiniquins buscando seu lugar ao sol com títulos de grandes qualidades e que mostram um pouco da nossa cultura ao mundo.

Não que considere o trabalho Big Hat Studios como um grande representante da nossa cultura no mundo dos jogos eletrônicos, afinal não me parece que esta tenha sido a intenção desta talentosa equipe de desenvolvimento, natural do estado de Minas Gerais. Com uma mensagem mais intimista e subjetiva, Dandara aborda temas de caráter mais global, como a luta pela liberdade e o caráter de resistência que a arte pode exercer em tempos sombrios e opressivos.

Porém, mesmo que não traga uma mensagem direcionada as situações sociais e políticas do nosso país, o game traz referências a cultura, história e elementos do cotidiano brasileiro em sua mitologia e ambientação - a começar pela sua protagonista, representação de uma lendária heroína quilombola.

Há um detalhe que talvez só chame a atenção de alguns gamers mais atentos, assim como outras tantas referências nacionais que estão presentes de forma pouco chamativa no título, que brinca com detalhes espalhados em seus cenários: basta um olhar mais atento e logo passamos a notar placas de ruas, caçambas de entulhos, pichações famosas da capital mineira. Esses e outros elementos comuns do nosso cotidiano estão espalhados pelas diversas ambientações do jogo, dispostos como detalhes pequenos, mas que aquecem o coração dos jogadores, não acostumados a ver elementos de sua realidade retratados em games.

No game, controlamos Dandara, uma heroína de um estranho mundo que deve lutar contra as forças opressiva dos Eldars. A questão é que o universo do game não é influenciado pela gravidade que conhecemos e, assim, nossa heroína pode se deslocar de forma única pelos cenários, deixando de lado a simples movimentação habitual dos jogos, para investir num deslocamento feito inteiramente através de longos saltos.

Basta apontar para o ponto que queremos saltar (cujo local é sempre demarcado por um material branco) e apertar um botão para realizar o salto, seguindo então para o próximo ponto e assim por diante.

É um sistema fácil de se lidar e tão original em sua execução que confere um estilo e uma abordagem única ao jogo. Apesar de ter um ar limitador por não permitir que nos movamos de maneira livre pelos cenários, este sistema de deslocamento abre possibilidades de movimentações que não vemos em outros jogos, já que permite que nos deslocamos pelos tetos e paredes com tanta desenvoltura quanto nos movimentaríamos pelo chão.

A experiência não é perfeita, pois a precisão com os controles no momento dos deslocamentos deixa a desejar em alguns momentos, porém não é algo que atrapalhe a campanha e, no geral, o simples ato de nos deslocarmos pelo cenário se torna uma ação divertida de ser executada.

Enquanto exploramos as diversas áreas do jogo e vemos suas salas girando para se adaptarem à perspectiva que temos, o game sempre parece ter um desafio diferente a apresentar. Nossos inimigos também podem andar por paredes e tetos e, com o tempo, seus modos de ataque também brincam com a “falta de gravidade” do jogo, testando nosso raciocínio e reflexos sobre como temos que nos deslocar para um local seguro antes de atacar o adversário, para então novamente retomarmos nossa movimentação.

Some esses combates a puzzles e desafios de plataformas que também abusam do nosso deslocamento gravitacional, e temos um jogo que oferece desafios diferentes a cada nova área, misturando estes elementos para criar obstáculos que nos obrigam a pensar de forma rápida e eficiente, principalmente nas lutas contra chefes, que estão entre alguns dos melhores momentos do game.

Porém, não é só com relação a sua jogabilidade que o game brinca com seu conceito de gravidade diferenciada, pois ele também é explorado em seu design artístico, que insere diversos artigos como móveis, árvores e indicadores pelos tetos e paredes dos cenários, criando um cenário que, embora pareça caótico, soa harmônico dentro de um universo que desafia as leis da física.

Com belos gráficos em pixel art e lindas animações (principalmente os destinados à heroína), o game traz uma boa composição de detalhes e cenários que trazem uma variação de ambientes interessantes, embora muitas vezes não soem harmônicos entre si. Isso nos leva a um terreno tortuoso, que diz respeito a um dos elementos menos eficientes do game: o seu estilo “metroidvania”.

Dandara é um game que se descreve como um “metroidvania” e entendo esta colocação, afinal ele tem um grande foco em exploração e uma estrutura onde novas habilidades abrem novos caminhos a serem desbravados pelo jogador. Mas o problema é que ele não parece lidar bem com esses elementos.

Os poderes que adquirimos durante o game não são muito interessantes ou divertidos de serem usados e durante a campanha nunca me senti desafiado ou instigado a experimentar os novos disparos que conquistava, de modo que muitos deles foram esquecidos no meu inventário. Mesmo as habilidades que nos permitem acessar novas áreas eram usadas quase que estritamente nos setores onde eram encontradas, tornando-se praticamente inúteis em outras áreas do jogo.

Quando falamos sobre “metroidvanias”, as novas habilidades ou poderes tem a função de abrir novos caminhos ao jogador, mas também devem instigar nossas imaginações sobre suas possibilidades em termos de gameplay. Por isso encontrar um novo item ou descobrir uma nova habilidade é tão recompensador.  

Se estes novos elementos não são explorados adequadamente, encontrá-los deixa de ser algo a ser almejado e atoda a experiência de exploração fica comprometida.

Isso sem contar que existe uma incômoda falta de conexão e harmonia entre algumas áreas do game. Quando olhamos para a composição artística de Dandara, salta à vista que embora suas ambientações sejam bem construídas e tragam ideias interessantes, alguns cenários soam muito discrepantes uns dos outros, como se não pertencessem ao mesmo universo.

Embora entenda que este caos estético deva ser justamente a intenção dos seus desenvolvedores, criando um universo subjetivo e amplo o suficiente para abrigar tantos elementos diferentes e por vezes antagônicos, o argumento do game não foi suficiente para me fazer “comprar” essa ideia.

Dandara não é um título que te dará informações de “mão beijada”. Muito de sua história precisa da interpretação do jogador ou são passadas em textos espalhados pelos cenários, o que acaba sendo uma das muitas influências que o game traz da série Dark Souls. Referências se encaixam muito bem na jogabilidade do título - como os locais de descanso que resetam os inimigos da área ou itens de cura recarregáveis -, mas infelizmente o mesmo não acontece com relação ao seu argumento.

A forma como Dandara passa sua narrativa simplesmente não me capturou, pois alguns elementos e explicações eram subjetivas demais e assim muitas vezes me via sem entender elementos que o jogo tratava como elementos básicos. Existe uma diferença muito grande entre deixar o jogador intrigado e confuso com uma informação. Dandara só conseguiu me deixar confuso e desinteressado pela sua narrativa.

Entretanto, os ótimos elementos de ação, sua beleza estética e o carisma de seus personagens me fez continuar a tentar desbravar e entender aquele universo tão cheio de elementos intrigantes.

Dandara não é um jogo perfeito, mas é com certeza um dos títulos com gameplay mais interessante que joguei nos últimos tempos, o que mostra o talento do nosso país quando o assunto são games. 

Dandara: Trials of Fear Edition foi lançado em março de 2020 para PC, Nintendo Switch, PlayStation 4, Xbox One, iOS e Android. Esta edição foi criada pelos desenvolvedores indie brasileiros da Long Hat House e publicada pela Raw Fury.

(Rafael Barbosa)

   

 

 

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