Está aqui o “Skyrim killer”, o maior RPG de
mundo aberto da história, o mais longo game já feito… Tudo isso já
foi dito nos últimos meses, pois o hype é enorme. Mas vamos começar
com os pés no chão, ignorando tudo isso aí que foi falado assim que
o jogo saiu, pois The Witcher 3: Wild Hunt é sim
absolutamente excepcional, viciante, com uma história cativante,
mas o hype outra vez foi bem exagerado.
O fato é que temos aqui um dos games mais bonitos e
bem cuidados da história, com uma ambientação vasta e belíssima que
rivaliza com cenários de mundos abertos que são verdadeiras
obras-primas, como os de GTA V, Red Dead Redemption e
Assassin’s Creed: Black Flag, por exemplo. As viagens a
cavalo pelas florestas, planíceis, praias e lagos de Wild
Hunt têm um fator imersivo único, viciante. Mas não dá para
dizer que temos aqui um open world no sentido literal da
expressão.
O conceito de mundo aberto parte do princípio de que
você pode viajar para qualquer ponto de um mapa usando os meios de
transporte do jogo - aqui neste caso, cavalos. Algumas regiões do
mapa, como White Orchard (que ambienta a primeira hora do game), o
arquipélago Skellige, Kaer Morhen e o Palácio Real de Vizima não
são acessíveis em tempo real, viajando a pé ou a cavalo. Então,
tecnicamente falando, não se trata de um jogo de mundo aberto.
Alguns outros lugares do mapa você pode até dar uma
fuçada, mas não vai conseguir derrotar os inimigos se não tiver
avançado o suficiente. Digamos, por exemplo, que suas habilidades
estão no nível 4, mas você resolve fuçar numa parte longínqua do
mapa na qual você só deveria chegar quando estivesse lá pelo nível
20. Resultado: vai encontrar inimigos nível 20 e não importa o
quanto tente, você não vai vencê-los. Então, é preciso controlar
seu ímpeto explorador de mundos abertos, pois isso pode matar parte
da diversão.
Outra característica essencial dos open worlds é que
ao explorar os cenários abertos você sempre encontrará muitos
elementos para interagir. Mas não espere encontrar muito disso em
Wild Hunt. Alguns lobos aqui, uns monstrinhos acolá, mas
não espere encontrar tesouros maravilhosos (como em Assassin’s
Creed: Black Flag) ou animais mitológicos (como em Red
Dead Redemption), pois não há muita distração para tirá-lo de
suas missões, sejam as principais, sejam as side-quests.
Diante desse contexto, a diversão aqui é entrar de
cabeça no enredo e não ficar explorando os cenários aleatoriamente,
pois só assim você vai poder curtir uma narrativa espetacular como
só um RPG de ação de altíssima qualidade consegue oferecer. Não
tente jogar Wild Hunt como você joga Skyrim ou
GTA.
Os combates também refletem essa espécie de política
da CD Projekt Red. A maioria das lutas você pode se virar muito bem
com uma espada mais leve e uma mais pesada, mas o jogo tenta a todo
custo incentivar você a usar ferramentas como o Sinal Axii, a luz
Igni, o óleo para espada ou as poções mágicas. OK, faz parte da
história, mas muitas vezes a gente só quer cortar algumas cabeças e
seguir em frente, sem ficar revirando páginas e páginas de um
inventário para descobrir qual item está faltando para fazer
determinada poção.
Essa história de que “o menos é mais” poderia muito
bem ser aplicada mesmo em RPGs de fantasia medieval, afinal, com
tantos elementos para administrar, não é nenhuma surpresa que os
“loadings” durem uma eternidade, assim como alguns diálogos - e
ambos poderiam ser diminuídos para a metade do tempo. Curiosamente,
quando jogamos com a belíssima Ciri, a coisa fica mais simples e
direta, ainda que as cenas de sangue pareçam ficar ainda mais
gores.
O fato é que poucos jogos conseguem envolver a gente
com tanta intensidade hoje em dia. Tornou-se comum ver nas redes
sociais amigos discutindo decisões tomadas durante a ação, soluções
para os problemas mais triviais (levei uma eternidade para achar a
cabra de um bruxo numa floresta: e era uma das coisas mais simples
a se fazer!) e dicas para as missões paralelas. Aliás, a quantidade
de side-quests é enorme e extremamente variada, passando de
aventuras empolgantes para bobagens irritantes que nem deveriam ser
chamadas de “missões”. Ainda assim, todas se exceção são muito
executadas, com mecânicas de ação impecáveis.
O fato é que longos diálogos e escolhas que você faz
ao longo do jogo trazem consequências na história que se desenrola.
Decisões tomadas em relação a uma aldeia, por exemplo, fizeram com
que eu voltasse lá depois de muitas horas de jogo. Eu a encontrei
destruída, como consequência de decisões que tomei. Isso cria um
senso de responsabilidade enorme com o enredo. É fantástico.
The Witcher 3: Wild Hunt é um jogo profundo,
com uma história interessante, personagens fantásticos e
ambientação viciantemente imersiva. Não é para brincar com amigos
numa festa ou pra se divertir nas horas vagas: ele é como um livro,
precisa ser degustado em horas e horas de jogatina, durante dias
seguidos. Para fazer esse review, por exemplo, completei 100 horas
de jogo e não consegui chegar nem à metade dele. E isso é
sintomático para mostrar a qualidade do que vimos.
(Fernando Souza Filho)