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A furtividade acompanha os videogames por muitos anos. É debatível se foi o primeiro Metal Gear, lá no MSX em 1987, que começou a coisa toda, mas o conceito perdura até os dias de hoje em franquias gigantescas como Assassin's Creed e o próprio Metal Gear. Mas ser stealth como um ninja (ou como um espírito?) também conversa diretamente com produções independentes – Ronin e Mark of the Ninja são provas contundentes. Aragami surge dessas sombras para reforçar ainda mais a ideia: além de ser indie, é o jogo de estreia do estúdio Lince Works, de Barcelona. E que estreia! O jogo é tão impressionante, que “precisamos” entrar em contato com os responsáveis. No bate-papo logo abaixo, o produtor de Aragami, David León, além de outros membros da equipe, responde nossas dúvidas:
Ainda estamos extasiados com a qualidade
de Aragami, ainda mais por ser o jogo de estreia de vocês.
Como isso foi possível?
Trabalhamos no jogo por quase quatro anos, começando como um
projeto de estudo para então ser retrabalhado e renovado, tomando
dois anos de trabalho em tempo integral.
Como o projeto nasceu? Vocês da Lince
Works já se conheciam antes de Aragami?
A maioria se conheceu na universidade, onde estudamos design de
games e arte. Tivemos tantos comentários positivos de jogadores,
estudantes, de fóruns online onde publicamos a demo, que percebemos
que tínhamos algo bom em mãos. Depois da graduação, nos mantivemos
juntos, continuando o desenvolvimento do jogo para aquilo que ele é
hoje, com um time de cerca de 12 pessoas.
Aragami se passa no Japão feudal,
mas vocês prefeririam criar um idioma próprio pro jogo. Como foi
isso?
As duas maiores questões foram liberdade criativa e recursos.
Japonês é uma língua bem complicada e como somos um time pequeno,
decidimos que seria melhor focar nosso tempo em fazer o gameplay se
destacar no lugar de lidar com tradução precisa para japonês, além
da dublagem. Também ajudou para adaptarmos o jogo e a história as
nossas necessidades. Caso tivéssemos grande parte do texto e das
vozes gravadas em japonês, não seria assim tão fácil mudar qualquer
coisa que tivéssemos necessidade.
O gameplay é 100% furtivo, a ponto que
combate direto é virtualmente inexistente. Como foi a elaboração da
mecânica de furtividade em Aragami?
Sim, furtividade é o foco principal, criamos o jogo com isso em
mente. Por mais que você seja poderoso e se torne cada mais forte
conforme progride, você sempre está em desvantagem e é preciso
pensar estrategicamente para conseguir derrotar os inimigos. Também
fizemos todos os poderes serem baseados em furtividade e dividimos
o gameplay em dois estilos de jogo diferentes – fantasma ou
demônio. Demônios aparecem e derrotam todos em seu caminho,
deixando um caminho de sangue para trás. Você joga de modo
agressivo e está sempre no limite de ser detectado. Fantasmas, por
outro lado, passam desapercebidos, antevendo as ações de seus
inimigos. Cada estilo de jogo é recompensado de forma igual e não
há punição para alterar entre os dois estilos seja lá quando
quiser. Dos seis poderes principais destraváveis, três deles são
agressivos, tornando mais fácil matar, desnortear ou se livrar de
grupos de inimigos [Demônio]. Os outros três são mais pacíficos,
permitindo que se distraia, localize ou se esquive de qualquer
ameaça [Fantasma]. Todas as fases foram criadas para ambos os tipos
de jogadores, com consideração idêntica.
A respeito do Aragami, o espírito, ele se
parece frágil fisicamente, mas cheio de poderes especiais. Como
isso funciona do ponto de vista dos controles?
Por mais que a ideia de “furtividade em primeiro lugar” fosse
sempre importante para o game design, também queríamos que os
jogadores se sentissem poderosos e mortais. Mas não podíamos só
torná-lo poderoso, porque assim a furtividade seria destruída.
Sendo assim, nossa abordagem foi tornar o Aragami uma espécie de
“canhão de vidro”, como dizem: poderoso e mortal, mas também frágil
e cheio de pontos fracos. Isso coloca o jogador nessa espécie de
jogo de gato e rato, elevando os limites dos poderes ao máximo, mas
também sabendo seu lugar quando se exagera na confiança.
Por mais que haja história no jogo, o
gameplay é total a prioridade, certo? Como esses dois elementos se
auxiliam no jogo, o tornando algo único?
Definitivamente colocamos os controles acima de qualquer coisa
quando criamos Aragami. Pra gente, isso é o que mais
importa. Mas a história também precisa ter significado para incitar
curiosidade na mente dos jogadores. Do contrário, você acaba
pensando “por que estou fazendo tudo isso?” O que teve mais apelo
pra gente foi criar um certo mistério para os jogadores. Dar
informação o suficiente para manter todo mundo intrigado, nunca o
bastante para revelar exatamente o que está acontecendo. Por grande
parte do jogo, você não sabe se está controlando um personagem bom
ou perverso, ou o que significa o espírito de Yamiko até a
revelação final.
Aragami não é um jogo difícil,
mas certamente é desafiador. É difícil balancear frustração e
satisfação para os jogadores?
Muito, muito difícil. Cada jogador é diferente e pede um certo
nível de desafio. É impossível criar apelo para todo mundo, mas é
possível oferecer opções cada que cada jogador se adapte ao jogo de
acordo com suas necessidades. Fizemos MUITOS testes com jogadores.
Com pessoas diferentes e em períodos diferentes do desenvolvimento,
várias e várias e várias vezes. Quando você trabalha num mesmo jogo
por tanto tempo, você não pode mais usar sua experiência para fazer
julgamentos. Você fica muito bom no jogo ou aprende todos os
truques sem ao menos perceber.
Vocês curtem muito a franquia
Tenchu, certo? Quanto às inspirações, o que ajudou a
tornar Aragami o jogo que ele é?
Tenchu foi sim uma grande inspiração, é um jogo que causou grande
impacto em todos nós, tanto como jogadores e quanto como
desenvolvedores. Foi um desses jogos que nos envolveu e não
conseguíamos parar de jogar. Até hoje, continua como uma das
grandes memórias dos videogames para nós e vários jogadores ao
redor do mundo. O que mais amávamos em Tenchu era como o
jogo conseguia manter o suspense e foi isso que tentamos recriar em
Aragami. Também observamos o que tornou Mark of the
Ninja um jogo tão bom e como jogos tipo Dishonored
conseguiram trazer de volta esse suspense e poder em jogos
modernos.
Você se considera frustrado com os jogos
de furtividade da atualidade, tipo a série Assassin's
Creed? Aragami é alguma espécie de
“protesto”?
É importante destacar que jogos de furtividade mais modernos são
divertidos à sua maneira e jogamos bastante, mas sim, sentimos que
há algo faltando aí quando o comparamos aos jogos mais exigentes e
difíceis que crescemos jogando. Nos certificamos que nosso jogo não
parecesse “diminuído”. De vez em quando, parece que o gênero
stealth perdeu muito dos elementos de suspense e desafio. Queríamos
que os jogadores sentissem essa tensão de novo – de ser encontrado,
estar em desvantagem, ser dominado e estar sozinho. Queríamos que
cada movimento fosse pensado, que fosse preciso planejar cada passo
desde o início, e não se jogar na situação de forma cega, apertando
todos os botões.
Quais os próximos passos da Lince
Works?
Estamos “brincando” com vários protótipos no momento, de várias
ideias que tivemos. Também esperamos por suporte pós-lançamento,
quem sabe tentando levar o jogo para outras plataformas. E obrigado
pelo apoio vindo do Brasil. É esse apoio que faz com que possamos
viver nosso sonho e esperamos visitar o Brasil um dia.